Tic tac, tic tac, tic tac… Nossa vida é uma luta constante contra o relógio. Precisamos nos dividir entre diversas atividades sendo algumas prazerosas e outras nem tanto. Com o tempo cada vez mais escasso, muitos podem se perguntar: porque devo reservar parte do meu tempo para uma prática espiritual?

Para exemplificar, contarei uma lenda que gosto muito. Há muito tempo atrás um homem que vivia ao norte do Tibete juntou-se a alguns amigos e decidiu fazer uma peregrinação até a residência do Dalai Lama, o Palácio Potala em Lhasa, local considerado sagrado.

Ao chegar lá, o homem ficou maravilhado com a imponência do palácio. Por curiosidade, enfiou a cabeça em uma abertura bastante estreita para conseguir ver melhor o interior. Após algum tempo, seus amigos o chamaram para ir embora e o homem percebeu que não conseguia tirar a cabeça daquele pequeno vão.  Ao perceber que estava entalado, o homem pede para que o grupo retorne para casa sem ele e que digam a sua família que ele morreu no melhor lugar possível, o Palácio Potala. Os amigos concordaram e partem em seguida.

Pouco tempo depois, ao realizar sua ronda tradicional, o zelador do templo vê a cabeça do homem e o questiona sobre o que ele estava fazendo ali. O homem diz que está morrendo, pois sua cabeça estava entalada. O zelador pergunta como o homem colocou a cabeça naquele local. O homem explica e o zelador diz para que ele tire a cabeça do mesmo modo que a colocou. Seguindo o conselho do zelador, o homem desprende-se da fresta.

Assim como esse homem, se todos nós conseguirmos ver de que forma estamos presos, poderemos então nos libertar e auxiliar os outros a fazer o mesmo. Porém, antes de tudo, é necessário que compreendamos como nós viemos parar onde estamos.

Todos nós viemos ao mundo para sermos felizes e passamos nossa vida em busca da felicidade. Porém, embora nós a encontremos diversas vezes durante nossa vida, ela é sempre temporária. Sentimo-nos muitas vezes fracassados e questionando por muito tempo o que é felicidade e porque ela se esvai por nossas mãos. Somos como atiradores de flechas, que as lançam em alvos que acreditamos serem os corretos, mas com o tempo vemos que não passaram de ilusão. Para alcançar a felicidade, precisamos mudar o alvo: precisamos erradicar o sofrimento e o dos outros de modo definitivo.

Nossa mente é fonte tanto de sofrimento quanto de felicidade. Ela é quem nos coloca para o alto ou para baixo, como uma montanha russa. Deixamo-nos levar por seus caprichos e esquecemos que cada pensamento, palavra e ação gera uma semente ao qual colheremos no futuro seu fruto. Como a pedra que lançada ao lago produz ondulações em círculos e esses círculos ao baterem na margem voltam ao centro, assim são nossas ações. Cada ação possui uma reação. Isto é o que chamamos de carma.

Vivenciamos os resultados que nós mesmos criamos e nossas reações produzem mais causas, mais resultados, ininterruptamente… É como se nossa vida fosse uma roda movida por nossas ações e a cada reação, um novo impulso é dado. E assim se passa nossa vida em ciclos, vida após vida… O interminável samsara, a existência cíclica.

Muitas pessoas acreditam que o remédio para o sofrimento e a solução de seus problemas está nas mãos de Deus, de Buda, de Alá, em algo exterior a ela. Infelizmente não. Se você está sujo, por exemplo, e se olha em um espelho, não adianta esfregar o espelho: a sujeira permanecerá lá! Portanto, as enrascadas que estamos somos nós mesmos que entramos, portanto, cabe a nós sair delas.

Buda disse uma vez a seus discípulos: “Eu lhes mostrei o caminho que leva à felicidade. Seguir por esse caminho é algo que depende de vocês.” Desse modo, por mais que recebamos a chave do conhecimento que nos permite conhecer, transformar e ensinar nossa mente a ser usada de modo positivo, somente nós é que decidimos se esta chave será usada ou não. Essa chave, uma vez usada, abrirá uma porta onde enxergaremos a verdade mais profunda de nossa mente, expondo nossa natureza búdica (ou pureza imortal) e suas infindáveis capacidades. Quando a natureza verdadeira de nossa mente é revelada, ou seja, quando alcançamos a iluminação, podemos finalmente encontrar a felicidade duradoura e auxiliar o próximo a conseguir o mesmo. Esse é o verdadeiro objetivo do caminho espiritual.

Portanto, independente da estrada que você trilhará seu caminho espiritual, não se esqueça de enxergar a si mesmo e os outros. Quando fazemos isso, nosso coração se enche de compaixão. A compaixão nos faz valorizar cada boa situação em nossa vida e nos inspira a sermos generosos conosco e com os demais. É disso que o mundo precisa: boas ações, bons pensamentos, boas ações, amor ao próximo e compaixão. Que seu caminho seja iluminado!

Tashi Delek!

Artigo por Ana Caroline Nonato.